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O executivo inquieto

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por Carlos Degas Filgueiras

Sempre fui inquieto, e me ocupar de muitas coisas ao mesmo tempo é o que faço o tempo todo. Meio que sem querer, tornei-me um especialista em multitasking. Não sei dizer se a pressão e a ansiedade impostas por esse hábito fazem mal à saúde ou se acabam sendo uma eficaz estratégia de sobrevivência para os dias atuais. Ainda assim, é impossível ser bem sucedido nessa ciência se não nos organizarmos ou nos focarmos em aumento de eficiência.

Meu primeiro experimento com multitasking não foi exatamente bem-sucedido. Tentei fazer duas faculdades ao mesmo tempo, enquanto estagiava em construção civil. Quando digo ao mesmo tempo não é no sentido figurado: fazia Engenharia Civil na Escola Politécnica/USP e Administração na FGV/SP com inúmeras disciplinas ocorrendo exatamente na mesma hora. Corria de uma faculdade para a outra, tentei aprender um game faltas e chamadas. Não deu certo. Acabei optando por abrir mão da Administração, ao mesmo tempo em que aprendi a identificar meus limites.

Por outro lado, todos que fizeram MBA nos EUA entendem o conceito de “tentar beber água de uma cachoeira”. As universidades americanas oferecem uma quantidade absurda de material para estudo, justamente para fazer os alunos aprenderem a selecionar aquilo que é importante. Assim vão nascendo seus recortes pessoais, as coisas nas quais você deseja se aprofundar, e os documentos sobre os quais você apenas passará os olhos, fará um overview não menos cuidadoso, mas obviamente sem tanto mergulhar, porque não há tempo para que sejamos especialistas em tudo. Penso que esse é um excelente retrato da vida real ou do dia a dia de um executivo: nos deparamos com uma quantidade infinita de informações, mas precisamos escolher quais serão os dados utilizados na tomada de decisão.

Nos anos seguintes, entre funções executivas, conselhos de administração, atividades pessoais e familiares, fui desenvolvendo técnicas que me permitiram lidar com vários projetos simultaneamente. Correndo o risco de parecer arrogante, confesso que, às vezes, sinto que consigo controlar o tempo e fazer quase tudo a que me proponho. Aqui vão algumas dicas, que funcionam para mim.

Em primeiro lugar, é preciso ser fiel à sua agenda. Tenho no calendário todas as minhas atividades, reuniões, almoços, esportes, viagens. Todas as reuniões, por exemplo, precisam ser curtas, terem horário para começar e terminar. Trabalho e tento criar uma cultura em que a variação nesses parâmetros seja inferior a dois minutos. Se não der para discutir tudo, adio os assuntos para outra reunião. É importante também dedicar, ao menos, 15 minutos diariamente para planejar o dia, pensar na semana, definir a melhor logística. Partir do macro para o micro, ter a visão do todo, antes de ir para o detalhe, é sempre um ótimo hábito para superar desafios.

“Delegar sem delargar” é outro conceito essencial. Precisamos decidir o que fica conosco, o que será desenvolvido por outros. Agora, quando transferimos centenas de atividades para outras pessoas, precisamos ter um excelente sistema de monitoramento e follow up dessas atividades. Aliás, delegar por si só é um desafio. Conheço muitos executivos de alta performance que pensam: “por que vou ensinar alguém a fazer essa atividade, se faço tão bem e tão rápido?” Pois é. Não dedicar tempo para ensinar alguém a desenvolver uma atividade tão bem como você é decretar a sua condenação perpétua a ser o único que consegue fazer aquela atividade.

Não aprendemos na escola a gerir e-mails, agendas, listas de tarefas, whatsapp. Ao mesmo tempo em que essas ferramentas às vezes substituem o velho e bom contato humano, permitem excelente ganho de produtividade. Por exemplo, os melhores CEOs que já conheci possuem suas caixas de entrada absolutamente em dia e respondem mensagens sempre em tempo adequado. Tenha certeza de que o volume acumulado de e-mails em sua caixa não é função da quantidade de trabalho que você tem, mas sim das técnicas e métodos que usa para manter suas atividades sob controle.

Por fim, é preciso saber escolher o que queremos fazer. Saber dizer não para reuniões onde você não precisa estar, repassar atividades burocráticas que não precisam ser feitas por você, ou até mesmo pedir licença quando alguém senta na sua mesa, fala sem parar e não vai embora.

Não quero dizer aqui que ter uma agenda repleta de atividades seja exatamente o melhor estilo de vida. Provavelmente não é. Todavia, para sermos bem sucedidos no mundo corporativo, acredito que não haja outro caminho. Hoje, depois de muito quebrar a cabeça sobre organizar o tempo, acabei encontrando uma fórmula. Dou vazão à minha inquietude, tenho a sensação de estar à frente e não atrás das minhas responsabilidades. Essa sensação baixa – e muito – a minha ansiedade e me permite viver bem dentro do caminho que escolhi para a minha vida.


Carlos Degas Filgueiras
Presidente da Adtalem Educacional do Brasil
Presidente do Grupo de Tecnologia e Gestão da Adtalem Global Education

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